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Virgilio Virgílio de Souza

As demandas de uma Cidade Partida

"É preciso deixarmos de lado pretextos e argumentos vagos e vazios, fazermos profundas reflexões e olharmos os problemas da Cidade de frente e não apenas com o olhar de uma elite privilegiada". Nas entrelinhas esse foi o principal recado dado no último dia do seminário “O Rio do Futuro” cujo objetivo era refletir o Plano Diretor aprovado pela Câmara dos Vereadores que vai transformar a realidade da cidade em todos os seus contextos nos próximos dez anos.

Se por um lado a Zona Sul e outras partes da cidade são bem assistidas, por outro, o poder público não consegue chegar aos subúrbios, favelas e periferias


Nos dias anteriores - o encontro se iniciou no dia 07), e terminou dia (09) - muitas das falas dos componentes da mesa , foram  positivas, falando de um futuro promissor,  e cheio de esperanças. Na quinta-feira, entretanto, a realidade nua e crua das pessoas mais pobres da cidade foi escancarada e mostrou outra cidade, outra realidade. Os componentes oriundos de favelas e periferias praticamente quebraram o protocolo, e a percepção de uma cidade ideal mudou completamente. As falas foram retas, diretas e alertaram para as contradições de uma Cidade Partida. Uma sociedade segregada que, porém, muitos ignoram ou fingem não ver.

Fazendo uma reflexão sobre o “Plano Diretor” e a realização do seminário em si, o vereador Paulo Pinheiro (PSOL) que participou de uma das mesas elogiou a iniciativa, as discussões e as audiências públicas que foram realizadas e definiram o Plano Diretor, mas ressaltou que é preciso que as diretrizes traçadas sejam cumpridas e que o plano Diretor não sofra interferências do prefeito como já aconteceu num passado recente:

- Eu e alguns companheiros discordamos profundamente de muitos pontos aprovados na elaboração desse Plano, saímos derrotados em muitas de nossas propostas, mas entendemos que num parlamento, perder ou ganhar faz parte da democracia. É preciso estarmos permanentemente atentos, pois na elaboração do último plano diretor (2010) definimos metas e prioridades de investimentos para  cidade que não foram cumpridas e todo nosso esforço acabou sendo atropelado e desconsiderado. Na verdade, o que vimos foi o prefeito Eduardo Paes atuar em sentido oposto a tudo que discutimos e, por sua própria vontade, decidir investir prioritariamente na Barra e Recreio, o que sob nenhuma hipótese estava previsto. Temos que admitir que vivemos em uma Cidade Partida, que temos sérios problemas no transporte, na habitação e na saúde. Não podemos ter um Plano Diretor que se preocupe e pense apenas em uma parcela da cidade e da sociedade. As políticas públicas e os investimentos  precisam chegar a todos e não a apenas a alguns – afirmou.

Por mais que o presidente da Câmara, Carlos Caiado, queira melhorar a imagem da “Casa do Povo”, o parlamento carioca continua merecendo pouca credibilidade por parte da população.  Raras são as oportunidades em que o público comparece para assistir espontaneamente uma sessão plenária. A casa só recebe um público razoável em votações de segmentos distintos e categorias profissionais – professores, ambulantes, ou moradores reclamando do barulho e do desordenamento da cidade. A própria frequência do seminário, em média 40 pessoas por painel, mostra esse desinteresse da sociedade pelas ações dos vereadores.

As observações de Paulo Pinheiro não são isoladas, pois um número considerável de pessoas critica alguns de nossos vereadores que, por interesses pessoais ou favores, se tornaram aliados do prefeito (não importa se Eduardo Paes ou Crivela), votando rigorosamente tudo o que o prefeito deseja. Agem como funcionários do prefeito ou um puxadinho da prefeitura. Se esquecem de que o papel do Legislativo é o de fiscalizar o prefeito, e não se tornar em aliado inseparável do Executivo. Esse grupo de vereadores compõe a denominada “base aliada” do prefeito.


Preto Zezé, Rene Silva, Camila Crispim e Monica Cunha participaram de uma mesa que revelou os descaminhos de uma sociedade desigual e uma Cidade Partida


As reflexões sobre essa “Cidade Partida” se fizeram presentes também no painel: “Cidade da Inclusão: um novo paradigma para superar a Cidade Partida". Com uma mesa composta por Monica Cunha, vereadora presidente da Comissão Especial de Combate ao Racismo, e uma luta intensa em prol das favelas e periferia, Preto Zezé, fundador da Cufa, Central Única das Favelas -, Renê Silva, fundador do Jornal Voz das Comunidades. Em sua fala, Mônica Cunha foi enfática:

- Não podemos perder de vista que a favela faz parte da cidade, que as pessoas que ali residem são partes vivas desse organismo, dessa cidade. Não podemos deixar de encarar e enfrentar a realidade e admitir que temos uma Cidade Partida e vivemos realidades distintas: uma antes do túnel e outra depois do túnel. Essa parcela que fica depois do túnel, e falo principalmente nas mulheres negras e nas mulheres de modo geral que vivem nesse lado menos protegido, são as que mais sofrem. Louvo a iniciativa da Câmara em promover esse seminário, mas nós vereadores, eleitos, temos que pensar uma cidade com mais equidade. Nós parlamentares e as autoridades dessa cidade e desse país precisamos entender que o problema real de nossa sociedade é o racismo. Temos que admitir que não há uma política pública que contemple de forma real aos mais desfavorecidos. Em nossa sociedade e nessa cidade,  uma parcela fica à margem dos direitos e tudo isso temos que atribuir principalmente à segregação e ao racismo. Precisamos entender que enquanto existir racismo, não haverá democracia. Não haverá saúde, educação, segurança. Muitos não levam a sério o que falo, mas não se trata de uma mera opinião ou de um discurso vazio. Falo baseado em estatísticas e, enquanto não combatermos e acabarmos com o racismo, nada vai mudar e nossa democracia nunca será plena. Será uma democracia apenas para alguns e uma cidade apenas para uns – completou.

Outra explanação importante  foi a de Preto Zezé. Quando provocado para falar sobre a questão climática e os problemas enfrentados no Rio Grande do Sul, ele optou por fugir do caráter nacional do problema e trazer a questão para nossa cidade, apontando os problemas sociais como a causa a ser combatida:

- Sabemos que tudo isso é um problema social. Esse debate sobre os problemas climáticos ficou preso por um grupo da classe média. Nossos políticos sentam, fazem acordos, mas essas pessoas se esquecem de que os temporais, a água, os vendavais não sentam à mesa para fazer acordos. É impossível se fazer acordo com a natureza. O que podemos é criar medidas preventivas. O Rio é uma cidade com características peculiares e um desastre dessas proporções em nossa cidade seria o caos.  Quando chegam as enchentes, sabemos quem boia nas águas e quem vai emergir na lama. Sabemos quem são os profissionais que estão na ponta. O problema é social e se estende, pois sabemos quem vai ficar preso dentro do ônibus voltando para casa e até quem não vai conseguir chegar em casa. O Rio Grande do Sul vai fazer a percepção de muita gente mudar. Vão perceber que com a natureza não há negociação nem acordos e a natureza não escolhe cor, raça ou classe social.

Renê Silva, falando sobre o seminário e sobre uma cidade para o futuro, fez observações sobre o que se propõe, o que está no papel e o que acontece na realidade:

- Lamento que os cidadãos que “estão no corre” não possam participar de um evento como esse. Os meios de Comunicação seriam fundamentais para divulgar e fazer chegar à sociedade as discussões travadas aqui, mas muitos desses veículos só aparecem nas comunidades para noticiar as invasões policiais ou algum tipo de tragédia. Não adianta olhar para o Rio do Futuro sem pensar  na realidade do presente. Temos que pensar nas crianças e nas escolas públicas. Temos que questionar o seguinte: o que essas crianças querem para o futuro? 

O seminário, que se iniciou na terça-feira (07) e se estendeu até a próxima quinta-feira (09), teve a iniciativa do Jornal O Globo e da Rádio CBN, teve o apoio da Câmara dos Vereadores. Os encontros aconteceram no Salão Nobre do Palácio Pedro Ernesto. O objetivo principal era o de se pensar a cidade a partir do Plano Diretor, cuja finalidade é definir os rumos da cidade nos próximos dez anos.

 

Apesar de sua importância o encontro teve pouca participação popular. Muitos presentes eram assessores e dos 51 vereadores, pouquíssimos foram os que compareceram para prestigiar o evento


O seminário teve os seguintes painéis:

 08/05 - DESENVOLVIMENTO HUMANO

  Painel 1:

Rio sustentável: o futuro e a proteção ambiental do novo Plano Diretor

Mediação - Marcelle Carvalho: jornalista

Vitor Hugo - vereador: presidente da Comissão de Meio Ambiente

Dr. Gilberto - vereador, vice-presidente da Comissão de Justiça e Redação

Claudio Hermolin - presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Rio de Janeiro (Sinduscon-Rio)

Thiago Dias - Subsecretário executivo da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação do Rio e Renato Jordão Bussiere - presidente do Instituto Estadual do Ambiente (INEA)

 Painel 2

Cidade educadora: como as diretrizes urbanísticas influenciam na educação e preservação do patrimônio.

Mediação - Marcelle Carvalho: jornalista

Thais Ferreira - vereadora, presidente da Comissão de Direitos das Crianças e do Adolescente.

Márcio Santos - vereador, presidente da Comissão de Educação

Renan Ferreirinha - Secretário Municipal de Educação

Thiago Gomide - mestre em História, Política e Bens Culturais (FGV) e criador do Tá na História.

Felipe Pitaro Ramos - gerente da Fundação Gol de Letra RJ



 Dia 08 –  Proteção Ambiental, Educação e Patrimônio

 Painel 1

 O Rio do Futuro Proteção Ambiental e Educação

Presidente da Comissão do Meio Ambiente,  vereador Vítor Hugo;

Com Deise de Oliveira  Delfino;  a vereadora Thias Ferreira, presidente da Comissão de Educação,  com o Subcretário Executivo de Desenvolvimento Urbano e Econômico Thiago Dias, E Cláudio Hermolin e com o presidente do Sindicato da Industria e do Comércio

Painel 2

Cidade Educadora

Presidente do Conselho da Criança e do Adolescente, Presidente da Comissão de  Educação Vereador Márcio Santos

O secretario Municipal de Educação Renê Ferrerinha,  o jornalista e Historiador Thiago Gomide e o gerente da Fundação Gol de Letra Pitaro Ramos

 

09/05 - INCLUSÃO E INTEGRAÇÃO

Painel 1

Cidade da inclusão: um novo paradigma para superar a ‘cidade partida’

Mediação - Carolina Morand: âncora da CBN

Monica Cunha - vereadora, presidente da Comissão Especial de Combate ao Racismo da Câmara do Rio e fundadora do “Movimento Moleque”

Tainá de Paula - vereadora e integrante da Comissão Especial do Plano Diretor

Renê Silva - fundador do jornal Voz das Comunidades

Preto Zezé - presidente nacional da Central Única das Favelas (Cufa)

Camila Crispim - Fundadora da Amor Mundi Projetos Educacionais 

 Painel 2

Rio para todos: como tornar a cidade mais acolhedora, com acessibilidade e lazer

Mediação - Carolina Morand: âncora da CBN

Paulo Pinheiro – Comissão de Saúde

Luciana Novaes - vereadora, presidente da Comissão de Defesa da Pessoa com Deficiência

Raphaela Athayde - superintendente adjunta do Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência (I BDD)

Flávio Canto - medalhista olímpico e fundador do Instituto Reação

Local: Palácio Pedro Ernesto

Endereço: Praça Floriano s/n, Cinelândia - Rio de Janeiro, RJ

 

 

 

 

 

 

 

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