"Nossos territórios culturais são múltiplos e vão além da visão romantizada de asfalto e favela"
Atualizado: 14 de jun. de 2021
“A visão de que a cidade se divide entre o asfalto e a favela é
equivocada e fantasiosa. A cidade é muito mais que isso, se
divide em muitos territórios, cada um deles, com suas
peculiaridades e um grande potencial cultural”.
Quando foi nomeado para a secretaria de Cultura do Município a grande maioria dos
fazedores de cultura tanto do asfalto, quanto a turma da favela - lançaram um olhar de esperança: acreditavam que Marcus Faustini era o nome mais apropriado para a pasta – a pessoa certa para o lugar certo. Os mais críticos, entretanto, torceram o nariz e não perderam a oportunidade para lançar um olhar de desconfiança: “será mais um cooptado e pau mandado de Eduardo Paes que não vai realizar rigorosamente nada e atender apenas aos interesses do prefeito e dos grupos da Zona Sul que dominam e manipulam a produção cultural da cidade”.
Até aqui Faustini dentro da difícil realidade que encontrou, com salários atrasados e vários equipamentos sucateados vem fazendo diagnósticos, e dentro de suas limitações, buscando soluções para o quadro caótico que enfrenta. A maior evidência do fato é ter convidado vários veículos de comunicação alternativos e comunitários – jornais impressos, brogs e emissoras de rádio – para um bate papo que ocorreu no último dia 2 de março, no auditório da prefeitura, no Centro da cidade.
O Secretario oriundo da Zona Oeste, que percorreu um longo caminho para ganhar projeção na cultura carioca, falou de seu respeito, simpatia e que entende a importância que esses veículos de comunicação denominados alternativos representam. Para deixar clara sua proposta, logo no início da conversa com representantes de mais de 20 veículos que se fizeram presentes, falou de suas intenções: Quer que a Secretaria de Cultural lance um novo olhar sobre todos os segmentos da produção cultural da cidade independente dos bairros que representam:
- É preciso entender que essa visão de que a cidade se divide entre o asfalto e a favela é equivocada e meio fantasiosa. A cidade é muito mais que isso, se divide em muitos territórios cada um deles, com suas peculiaridades e um grande potencial cultural. Meu desejo com essa reunião com vocês que representam esses meios comunitários e alternativos é por entender e saber que vocês verdadeiramente representam um papel de suma importância em cada um desses territórios. Tenho o claro discernimento que são esses veículos, que dão voz e vez às manifestações culturais de cada uma desses territórios e das dificuldades que vocês encontram de chegar ao poder publico.
Segundo o secretario, inicialmente a Secretaria de Cultura terá um programa na Rádio Rocket Pinto que se iniciará muito provavelmente ainda no primeiro semestre. A intenção é que os profissionais desses veículos ajudem a construir a programação e o conteúdo onde serão mostrados diversos aspectos da produção cultural dos mais variados territórios:
- A idéia é difundirmos da melhor maneira que pudermos a produção cultural da cidade em seus mais diferentes aspectos e nesse sentido, precisamos produzir conteúdo em relação ao que a cidade produz. Com esse programa na Rádio Rocket Pinto, ao mesmo tempo em que teremos informações do que vem acontecendo nos mais diversos territórios estaremos também possibilitando que esses veículos ganhem mais visibilidade. Nosso objetivo é no segundo semestre lançar um edital de fomento que possa auxiliar esses meios alternativos.
Dificuldades encontradas
Durante a conversa o secretario aproveitou para falar um pouco sobre a realidade dos equipamentos culturais e as dificuldades que encontrou quando assumiu:
- Ainda estamos fazendo um diagnóstico dos mitos problemas que temos. Vocês sequer imaginam o quadro caótico que temos pela frente. Quando assumi imaginava que os problemas deixados pela administração anterior fossem apenas de incompetência e má gestão, mas a realidade não é essa, é algo bem pior, pois o que havia na verdade, era uma grande perseguição às muitas atividades culturais. A idéia era a de um processo de exclusão. A administração anterior não se importou, deixou de investir.
Preocupado em olhar muito mais para o futuro que ficar culpando a administração passada, relatou apenas alguns dos principais problemas que terá que resolver com urgência:
- Os descasos para com os equipamentos culturais são de tal ordem, que o palco do Teatro João Caetano, um dos mais importantes da cidade, estava tomado por traças, as lonas culturais e as arenas estavam sem pagamento e sem investimento e o Teatro Sérgio Porto estava com a energia cortada em razão de um gato – ligação da energia feita de forma irregular. Negociamos com a LIGHT e vamos pagar de forma parcelada. Esses são apenas alguns problemas, mas existem muitos outros – salientou.
Sem um orçamento que lhe permita grandes realizações o secretario falou do que pretende realizar de imediato:
- Nessa proposta de respeitar todos os territórios de cultura da cidade. Havia a idéia de se transformar as lonas culturais em arenas, mas essa proposta dentro da realidade que vivemos é inviável. Vamos dentro de nossas possibilidades recuperar as lonas e transformá-las em espaços para as comunidades. Os espaços do município devem ser ocupados com as mais diversas programações. É uma falácia dizer que as pessoas não ajudam a cuidar desses equipamentos, elas simplesmente não são convidadas a participar. O papel dos equipamentos tem que ser o de acolher e informar. Podemos, por exemplo, auxiliar as mulheres em situação de riscos, orientá-las, encaminhá-las e protegê-las. Temos que criar mecanismos e direcionar essas mulheres para outras atividades. Esses espaços precisam ser ocupados e freqüentados de todas as maneiras possíveis. Porque não servirem, inclusive, para ara comemoração de aniversários? –indaga
No final da conversa Faustine falou sobre as criticas que a administração atual sofre de alguns setores em relação à sua política cultural:
- Muitas pessoas criticam, vivem de criticar. Onde estavam essas pessoas na administração anterior? - Porque se calaram?
– e prosseguiu:
- O problema é que ficar atrás de um computador criticando é fácil. Muitas dessas pessoas se acostumaram com balcões, com negociatas e sempre se beneficiaram agindo por trás os bastidores. São “tigrões” nas redes sociais e se mostraram “thuthucas” caladinhas na administração anterior.
A cultura me salvou mais que a educação
Demonstrando tranquidade e segurança relatou sua experiência no campo cultural relembrando que participou de todas as conferencias de cultura, de sua experiência na Rede de Juventude onde por dez anos tem a oportunidade de fazer intercâmbio cultural com a Inglaterra e outros países e da maturidade que adquiriu em relação às questões culturais com o decorrer dos anos:
- Afirmo a vocês que a cultura foi fundamental e determinante em minha vida, diria mesmo que foi mais importante que a educação. A cultura me deu capacidade de entender o mundo quando aos 16 anos participei da primeira peça de teatro. Fui mergulhando cada vez mais nesse universo cultural, participei de todas as conferencias municipal, estadual e nacional de cultura e hoje percebo que muito do que discutíamos ali, das resoluções que tomávamos eram inviáveis do ponto de vista de execução. Entendo que o papel da Secretaria de Cultura é dialogar com todos os territórios. Um grupo de teatro da Zona Sul, ou do Centro vive uma realidade totalmente diferente ao de um grupo de Santa Cruz, Madureira ou bairros de periferia. O Rio tem 450 grupos de bate bolas que reúnem de 40 a 60 integrantes cada um e essa é uma área de interesse da cultura
Conferencia Municipal de Cultura e intercâmbios
Para Faustine é extremamente importante que a cidade realize a Conferencia Municipal de Cultura e que faça intercâmbios, pois a cidade precisa retomar seu papel de relevância no país:
- Temos que investir tudo em nossa potencialidade cultural, pois somos uma potencia em se tratando de cultura que é um dos principais atrativos da cidade. Assim que essa pandemia passar vamos realizar a Conferencia Municipal. Isso é de extrema importância. Temos feito contatos e buscando intercâmbios para alavancar nossa produção cultural. Já fizemos uma aproximação com a Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo e vamos desenvolver outras. O Rio tem que voltar a ser respeitados em sua produção cultural e ter o protagonismo que sempre teve. São Paulo tem belas iniciativas, conseguiram avançar muito nos últimos anos em muitos aspectos e temos que nos aproximar dessas experiências – encerrou.
Marcus Faustine
“Muitas pessoas se acostumaram com balcões, com negociatas
e sempre se beneficiaram agindo por trás os bastidores.
São “tigrões” nas redes sociais e se mostraram “thuthucas”
caladinhas na administração anterior”.
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