Lapa, entre a barbárie e a civilização
Atualizado: 7 de mar. de 2022
"Rio 40 graus
Purgatório da beleza
e do caos
Quem é dono desse bêco?
Quem é dono dessa rua?
De quem é esse edifício?
De quem é esse lugar?
O Rio é uma cidade de cidades misturadas
O Rio é uma cidade de cidades camufladas
Com governos misturados, camuflados, paralelos
Sorrateiros, ocultando comandos..."
Rio 40 graus - Fernanda Abreu
O prefeito Eduardo Paes está perdendo uma transformação incrível que vem ocorrendo na cidade: a capacidade que a Lapa tem de se transformar em questão de minutos de um lugar ordenado, civilizado, acolhedor, numa terra de ninguém, onde vale tudo, rigorosamente tudo. O multiverso - a tal realidade paralela -, já chegou por aqui e ao que parece, o prefeito ainda não foi informado. Pode com isso, estar perdendo uma bela grana com publicidade.
Entre 18 e 3h da manhã, um comboio da prefeitura com direito a um caminhão para recolher material de ambulantes e uma viatura da Policia Militar protege as ruas da Lapa
A situação é extremamente dual e das mais complexas: entre 18 e 3h da manhã, com a presença e o olhar do poder público - SEOP – Secretaria e Ordem Pública -, Guarda Municipal, e Policia Militar e um monte de funcionários com coletes de Ordenamento Urbano -, tudo funciona de forma, ordenada tranquila e segura sem a presença de ambulantes, uma das principais queixas e que muito incomoda aos donos de bares, restaurantes e casas de shows.
Depois das 3 da manhã, entretanto, quando os órgãos públicos “metem o pé” o trecho da Mem de Sá entre os Arcos da Lapa e a Praça João Pessoa se transforma em algo indescritível. Como à noite todos os gatos são pardos, figuras da noite surgem do nada, se misturam aos ambulantes, turistas e transeuntes e o trecho antes civilizado, é pura adrenalina - um verdadeiro vale tudo - , com a venda dos mais variados produtos possíveis e enormes caixas de som. O caos que se instala por todos os cantos proporciona um ambiente propicio para muita confusão, brigas, assaltos... A situação fica ainda mais caótica após as 4h30, quando os policiais do Lapa Presente terminam o turno de trabalho.
Não sem razão um grupo de proprietário de bares e restaurantes mais especificamente da Lapa olhando pelo prisma da civilização - a Lapa das 18 às 3h da manhã -, fez circular uma nota nas redes sociais agradecendo ao prefeito, a seus colaboradores e à Policia Militar a segurança e tranquilidade que reinou na Lapa no período de carnaval. Possivelmente a carta foi escrita por um integrante do denominado Polo Gastronômico Novo Rio Antigo onde alguns associados tem boa relação e respeitam os vizinhos. Pessoas descentes, que fizeram tratamento de som e não entopem as calçadas de mesas e cadeiras. Diz a nota:
NOTA PÚBLICA DE AGRADECIMENTO
O melhor carnaval de rua do Rio é aqui!
Proprietários de bares e restaurantes da Lapa, da Rua do Lavradio e adjacências, agradecem ao Secretario de Ordem Pública , Brenno Carnevale, ao Sub Prefeito do Centro , Leonardo Pavão, ao Comandante DO 5º BPM, Coronel Ludogero e ao Comandante do Lapa Presente Major Leo Laureano pelo ordenamento exemplar do carnaval na Lapa oferecendo ordem e segurança a todos nós, aos foliões, cariocas e aos turistas que vieram prestigiar o carnaval do Rio, primeiro destino turístico noturno do Rio de Janeiro.
Agradecemos também à Comlurb pela limpeza urbana realizada de madrugada em todas as ruas e avenidas da região. Podemos afirmar que em décadas, essa é a primeira vez que esse serviço de proteção é oferecido aos turistas, e a nós empresários da região.
Nossas casas estarão aqui em abril oferecendo aos cariocas e ao mundo a melhor experiência do carnaval Carioca no Centro Histórico do Rio de Janeiro
MUITO OBRIGADO
Eduardo Paes deve ter tido conhecimento da carta já que muitos desses comerciantes frequentam os corredores da prefeitura. O que o prefeito talvez não saiba é que alguns empresários são totalmente baderneiros e ilegais e pegam carona naqueles que são legais. Figuras que sem qualquer identidade com a Lapa ou com qualquer outro bairro que, apesar de cobrarem ordem, são os principais responsáveis pela desordem. Para que esse choque de civilidade tivesse um efeito real o Secretario de Ordem Pública Brenno Carnevale deveria equipar seus comandados – fiscais e guardas municipais – com uma ferramenta tradicional e indispensável chamada decibilimetro e orientá-los para que fossem mais rígidos com as mesas e cadeiras nas calçadas.
Ordenamento com casas perturbando a ordem e não deixando os moradores dormir necessariamente cai em descrédito. Como cai em descrédito quem tenta criminalizar e perseguir ambulantes. Da mesma maneira que existem comerciantes e empresários sérios, legais e responsáveis, existem também ambulantes sérios, legais e responsáveis, que não causam desordem e estão preocupados apenas em ganhar algum dinheiro para ajudar no sustento da família. Perseguir ambulantes e não coibir mesas e cadeiras e barulho nos remete à velha discussão do preconceito e da segregação social.
A maior evidencia do fato é que não só os moradores sofrem com os comerciantes arruaceiros. Na Avenida Mem de Sá, chegou-se ao ponto de bares tradicionais como Carioca da Gema, e Sacrilégio terem que pedir para o bar que fica do outro lado da rua diminuir o volume do som. Mesma realidade vive o Sarau Rio cujos clientes são importunados pelo bar que fica em frente. O absurdo é de tal ordem que em alguns momentos o som chega a perturbar os shows que acontecem no Circo Voador.
Moradores seguem
Angustiados e sem esperanças
A Ordem Pública é incapaz de coibir o excessivo número de mesas e cadeiras nas calçadas. Após as 3 das da manhã, quando a ordem pública "mete o pé", os ambulantes voltam a ocupar todas as calçadas. Na manhã seguinte os moradores são obrigados a conviver com o lixo deixado por algumas desses comerciantes beneficiados pela "ordem"
Se os comerciantes – que não moram na Lapa - têm motivos para comemorar, os moradores não. No último dia 25, o prefeito Eduardo Paes esteve reunido com 31 associações de moradores de diversos bairros da cidade. No encontro promovido pela FAM – Federação das Favelas do Município -, e pelo Fórum da Cidadania que reúne em torno de 40 associações, os moradores que representavam a Lapa e a Cruz Vermelha falaram exatamente do transtorno das mesas e cadeiras colocadas sobre as calçadas e do excessivo barulho.
Na ocasião o prefeito que estava acompanhado do Secretário de Ordem Pública Brenno Carnevale e do subprefeito da Zona Sul Flavio Vale ouviu tudo com muita atenção, marcou um novo encontro e cobrou solução para os problemas. O subprefeito da Zona Sul que assumiu o cargo a pouco mais de um mês, chegou a ser elogiado pelo prefeito e aplaudido pelos presentes por coibir o desordenamento em bairros da Zola Sul e possibilitar um pouco de paz aos moradores.
Mas na Lapa a realidade é diferente, por mais que se queixem, os moradores sofrem com os desmandos e descasos. Dona Teresa Dantas que é contadora e mora exatamente em frente ao posto de gasolina bem próximo dos Arcos da Lapa diz que já não tem esperanças que o prefeito resolverá os problemas dos moradores:
- Moro aqui há 30 anos e juntamente com muitos moradores já não temos a ilusão que o prefeito fará alguma coisa. Eduardo Paes se tornou um aliado dos donos de bares e restaurantes, só procura beneficiar os comerciantes e tenta dar uma falsa aparência de ordem para atrair os turistas e se esquece que nessa região moram pessoas idosas, crianças e trabalhadores que precisam descansar. Aqui, depois que os bares fecham e que a segurança da prefeitura que se tornou uma espécie de segurança privada para os donos de bares vai embora, chegam os ambulantes com suas caixas de som e o inferno continua. Existem casos de vizinhos que chegaram a ser ameaçados por ambulantes e traficantes que dizem que na Lapa vale tudo e quem estiver incomodado tem que se mudar. O prefeito tem que saber que comerciantes e turistas não elegem ninguém e ter vergonha de existir uma área tão bagunçada e entregue à própria sorte - afirmou.
"Aqui, depois que os bares fecham e que a segurança da prefeitura que se tornou uma espécie de segurança privada para os donos de bares vai embora, chegam os ambulantes com suas caixas de som e o inferno continua. O prefeito tem que saber que comerciantes e turistas não elegem ninguém"
Claudemir da Silva que mora em Bento Ribeiro e trabalha de porteiro de 6 às 18h em um dos prédios próximo ao Restaurante Nova Capela diz que frequentemente vê coisas que até Deus duvida: “Quando chego aqui para trabalhar por volta de 5h50 às vezes me assusto com o que vejo. Os turistas são assaltados, pessoas consomem drogas no meio da rua, outros fazem sexo encostado nas árvores tudo isso embalado pelas caixas de som dos ambulantes. Os moradores que precisam sair cedo para trabalhar ficam assustados. Qualquer um sentiria vergonha de viver num lugar assim - declarou. Para Valéria Veiga que também mora na Mem de Sá, próximo à Praça João Pessoa e é publicitária a Lapa mudou pra pior:
- Enquanto algumas casas ficam abertas, com seus seguranças na porta a coisa ainda funciona de maneira minimamente civilizada, mas quando essas casas fecham entre 2 e 3h da manhã, isso aqui vira um inferno. A bagunça é geral e ninguém consegue dormir. A situação piorou muito com os quatro anos de Crivella, tiramos o bispo colocamos o Eduardo Paes que assumiu e parece totalmente perdido e impotente para resolver os problemas. A pandemia, a cidade vazia, a tara dos comerciantes que só pensam em lucros e vivem reclamando acabaram por deixar o prefeito perdidão. Morar na Lapa foi um dos maiores erros que cometi em minha vida - comenta.
A situação piorou muito com os quatro anos de Crivella. Tiramos o bispo, colocamos o Eduardo Paes que assumiu e parece totalmente perdido e impotente para resolver os problemas.
Comerciantes comemoram
Com a festa na rua proibida e onde os blocos não puderam desfilar e sem a presença de ambulantes os donos de bares comemoraram o ordenamento de carnaval civilizado
Eduardo Paes não é exatamente um religioso, mas nem Marcelo Crivella dublê de bispo com prefeito e que alguns desses comerciantes viviam bajulando, conseguiu separar o joio do trigo. Para muitos moradores a responsabilidade de todo caos deve-se ao Polo Gastronômico Novo Rio Antigo, o que definitivamente não corresponde à verdade e chega a ser uma injustiça. Se os órgãos de ordenamento da prefeitura não conseguem identificar, multar e coibir os arruaceiros, como os integrantes do Polo poderiam fazê-lo?
O problema do barulho provocado por algumas casas se arrasta por muitos anos. Em 2017, Thiago Cesário Alvim, proprietário do Carioca da Gema, enquanto ainda presidente do Polo, em entrevista ao Jornal Capital Cultural disse que não podia e nem tinha poderes sobre os estabelecimentos da região que provocam qualquer tipo de desordem:
- Eu cuido e administro o Carioca da Gema o que já é muito trabalhoso. O que buscamos é orientar aos nossos associados a respeitar e ter uma relação de cordialidade e respeito com os vizinhos evitando barulho excessivo. Se alguns não o fazem isso, passa a ser um problemas da prefeitura e dos órgãos de fiscalização. Eu posso garantir que temos uma ótima relação com nossos vizinhos e temos também, que lembrar que nem todos os comerciantes dessa região são associados ao Polo – comentou na ocasião.
Plinio Froes proprietário do Rio Scenarium que sempre batalhou por melhorias no Centro, ao saber dessa dualidade que invade as madrugadas foi definitivo em sua interpretação sobre o ordenamento na região:
- Fizemos nossa parte, fomos aos órgãos competentes, reclamos e conseguimos dentro do possível ordenar o Centro nesse carnaval. As pessoas que vieram, principalmente os turistas se sentiram mais seguros. Com a presença da polícia e da Secretaria de Ordem Pública as coisas transcorreram da melhor maneira possível e a esperança é que esse trabalho continue. Penso que com o ordenamento todos se beneficiam tanto os comerciantes quando os moradores, mas é preciso ficar claro que não temos responsabilidade com o que acontece nas ruas e muito menos com as casas que criam qualquer tipo de transtorno. Os moradores devem se organizar e cobrar dos órgãos públicos ações em ralação esse desordenamento - finalizou.
Acho que você, amigo Virgílio, deveria se preocupar também com os botequins que tomam a calçada e joga o pedestre para o meio a rua.
Um deles, na Mem de Sá, entre o Bar Brasil e o Nova Capela, que chega a fechar a calçada com grades, impede a passagem e o cidadao de ficar no ponto de ônibus em frente.
A quem reclamar?
Meu amigo, você deveria ter feito referência a determinado botequim, localizado entre o Bar Brasil e o Nova Capela que ocupa toda a calçada e prejudica demais os que estão no ponto de ônibus na frente e têm que ficar na rua.