Lapa: no “novo normal” os antigos problemas
Atualizado: 19 de jul. de 2021
Apesar da propagação da
“Variante Delta” bairro começa
a ficar superlotado, com muitas
pessoas nas ruas e sem
qualquer ação da prefeitura
A Lapa lentamente volta a bombar. Vai retomando seu perfil de ser o maior ponto de visitação noturna da cidade. No “novo normal” imposto pela prefeitura onde os espaços podem funcionar com apenas 50% de capacidade, o bairro vive antigos dilemas e uma constatação: permanece sofrendo com a ausência total do poder público para coibir os exageros.
O problema não reside exatamente nas casas onde as restrições e a lei se impõem e os proprietários, uns por medo de multas e outros por serem zelosos e entenderem que o vírus permanece no ar tomam todos os cuidados. Com isso, respeitam os limites impostos, controlam o número de frequentadores, disponibilizam álcool e gel e os funcionários são todos obrigados a usar máscaras. Logo, o problema da disseminação de um vírus que é uma ameaça, não está exatamente das portas para dentro.
Todos os desmandos e descasos na Lapa acontecem exatamente nos espaços públicos – ruas, calçadas, esquinas - onde ao som de música muito alta, as aglomerações acontecem com centenas de pessoas sem máscaras ou qualquer cuidado. Se valendo disso, alguns proprietários espertalhões fazem das calçadas verdadeiras extensões de suas casas. Uns chegam a gradear as calçadas outros entopem as calcadas com mesas e cadeiras sem deixar nenhum espaço para os moradores, turistas e transeuntes. O que a prefeitura faz? - Exatamente o que sempre fez: nada, rigorosamente nada.
Ao que parece a SEOP – Secretaria de Ordem Pública – que neste sábado (17) encerrou uma festa com 300 pessoas na Barra da Tijuca, chegando a multar a casa por consumo de cigarro em lugar fechado e menos ainda nosso Exmo. Sr, prefeito Eduardo Paes leram o alerta do Secretario de Saúde do Município Daniel Sorans. O secretário fez um apelo em seu perfil nas redes sociais, também no sábado (17), pedindo para a população não abandonar os cuidados, usar máscaras, e evitar aglomerações em razão da “Variante Delta”, cujo número de casos vem aumentando na cidade – são 23 casos no município e 74 no Estado.
- A Variante Delta realmente esta se instalando na cidade. Recebemos a confirmação de mais 15 resultado positivos do laboratório da UFRJ e já são 23 os casos confimados”, acrescentando em sua mensagem: #UseMascara evite qualquer tipo de exposição desnecessária.
Grosseiros e negacionistas...
Tentar entender a razão de tanto desprezo para com uma doença que assusta o mundo e a falta de zelo para com a vida, eis a questão... Na sexta-feira, quando perguntado sobre se não temia tanta aglomeração e temia se contaminar uma vez que tinha que atender muitas pessoas, o dono de uma das casas que gradeou a calçada na Mem de Sá se mostrou extremamente irritado:
- Pô meu amigo, tá nessa? – Não fode. Minha preocupação é em recuperar o tempo perdido e a grana que perdi nesse tempo que fiquei com a casa fechada. As pessoas ficaram mais de um ano presas dentro de casa e querem extravasar. Querem sair, dançar, beber, paquerar e beijar na boca. Essa doença tá sob controle. É coisa do passado. Chega de falar em pandemia e no vírus. Esse excesso de cuidado já deu. Tá enchendo o saco.
Mais à frente nas proximidades do Bar Leviano, próximo aos Arcos da Lapa, o estudante de educação física Daniel Lourenço de 23 anos que não é do Rio – mora em Jundiaí – quando questionado se não temia a aglomeração, disse que se sentia tranquilo e seguro e se sente totalmente e protegido:
- Tem muito delírio e muita fake news nisso tudo. Eu faço educação física, malho todos os dias, me cuido e, desde o início da doença, me resguardo e tomo um coquetel de hidroxicloroquina/ivermectina e, com isso, me sinto tranquilo e protegido. Eu tenho imunidade e se a doença me atingir, metade da ´população já terá morrido. Na verdade vim ao Rio para tentar ver o jogo do Flamengo, pois estou com muitas saudades de ver o "Mengão" jogar, mas vir ao Rio e não curtir a Lapa com caipirinha a R$ 8, isso sim, é estar doente.
No sábado, mais uma vez, a superlotação com as mesmas casas cometendo os mesmos delitos se repetia, mais uma vez, com a ausência total do poder público. A administradora de empresa Isabelle Faria de 26 anos, estava com a namorada e duas amigas – todas usavam máscara -, e se encontravam um pouco mais afastadas do tumulto, ouvindo a música que vinha do Bar Leviano, próximo aos Arcos. Quando perguntada se não temia tanto aglomeração e estar num espaço com tanta gente sem máscara, ela disse que toma todas as preucações necessárias:
- Não, eu não me misturo. Uso máscara, tenho álcool em gel e não entro no tumulto. Sim acho arriscado, mas penso que tomando todos os cuidados necessários dá para curtir a Lapa um pouquinho. Trabalhei a semana toda e estou cansada de ficar em casa vendo Neteflix e mereço uma cerveja. Mas concordo que tudo isso aqui é um absurdo, a maioria das pessoas não tomam nenhum cuidado.
Um pouco mais adiante na esquina da Rua Mem de Sá com Gomes Freire, o arquiteto Antônio Leônidas Neto de 42 anos, que estava de máscara e passava pelo local, quando indagado se não temia tanta aglomeração foi enfático em sua resposta:
- Rapaz eu só estou aqui de passagem, pois moro no Cores da Lapa e estou indo para casa. Isso aqui é uma loucura, todo mundo sem máscara, sem qualquer cuidado. Essas pessoas deveriam sofrer algum tipo de punição. Tenho uma filha de um ano e só de passar aqui fico temeroso. É impossível que as pessoas não vejam os números, não acompanhem os noticiários e tenham tanto desprezo pela vida - encerrou
Eduardo Paes:
Politicamente correto ou
um Bolsonarista enrustido
A postura do prefeito Eduardo Paes em relação ao enfrentamento da pandemia é extremamente dual. Em alguns momentos parece se importar apenas com a economia, os empresários e adquiri ares de negacionista, a exemplo do presidente Jair Bolsonaro. Com tantas vidas em jogo não dá para fazer cara de paisagem ou ficar em cima do muro. Não dá para ver toda esculhambação na Lapa e em outros pontos da cidade sem fazer rigorosamente nada. Assim como não dá, para ver os barões do transporte retirarem várias linhas de ônibus de circulação sem uma atitude mais drástica contra esses senhores que sempre levaram vantagens em cima do estado.
O prefeito é extremamente feliz e demonstra ar de seriedade e responsabilidade quando afirma que vai agir com as orientações do Conselho Médico da cidade deixando claro que “a festa de revellion ou o carnaval só acontecerão”, caso toda população esteja vacinada. Por outro lado age com a irresponsabilidade de um bolsomion quando permite um vale tudo, com o desembarque na cidade de pessoas de todas as partes do mundo sem nenhuma checagem ou comprovante de imunização. É claro que pensar o turismo é importante. É claro que a pressão da rede hoteleira é grande, mas um bom legislador, antes de tudo e acima de tudo, se preocupa com a vida.
A Lapa, lotada, aglomerada e território de turistas de todas as partes do mundo é sim, a possibilidade real da disseminação das Variantes Delta e outras que possam aparecer e, exatamente por isso, deveria se transformar em um laboratório de experiências da cidade. Nos finais de semana, as pessoas que decidissem ir à Lapa, deveriam obrigatoriamente ter que apresentar carteirinha com vacinação. Os turistas, por sua vez, deveriam apresentar o teste de Covid. Além disso, uma equipe médica deveria fazer testagem de forma aleatoria nas pessoas. É exatamente desta maneira que outras cidades, dentre elas Tóquio e Paris estão agindo.
Numa medida mais extrema as pessoas sem máscara e que não respeitassem as medidas de segurança deveriam ser multadas. A “Indústria da Multa” não é um problema para a prefeitura que num passado recente multava os mijões ou quem jogasse guimba de cigarro no chão e, atualmente, tem enorme facilidade para multar e guinchar os carros parados em lugares proibidos. Se não é possível ter um controle sobre o vírus, é perfeitamente possível ter um controle sobre os disseminadores do vírus e de todas suas variantes. Seguramente a Lapa é um dos principais pontos de disseminação da cidade.
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