Vereadores analisam a “Guerra Santa” que vivemos
- Virgilio Virgílio de Souza
- 20 de out. de 2022
- 6 min de leitura

Embora tenham visão de mundo distinta e, na maioria das vezes antagônicas, os vereadores Atila Nunes (PSD - eleito com 10.621); que criou a lei que estabelece o Dia de "Seu" Zé Pilintra, comemorado no dia 07 de julho; Inaldo Silva (Republicanos - 21.885 votos) que é bispo da Igreja Universal e Reimont Ottoni (PT - 16.082 votos), que era padre e deixou a Igreja, mas permanece atuante em prol dos mais pobres e marginalizados, comungam de um mesmo princípio e bebem de uma mesma fonte: são cristãos, logo, seguidores do “Príncipe da Paz” Jesus Cristo. Além disso, outra coisa que têm em comum e o fato de serem políticos, eleitos democraticamente pelo voto.
Diz uma máxima popular que religião e política não se misturam. Nesse "brasilzão" de Meu Deus, se misturou sim, e a barra pesou. O maior exemplo dessa realidade é que existe na Câmara Federal a Bancada da Bíblia, com figuras nefastas falando em nome de Cristo, mas em muitos casos com comportamento satânico. Se Cristo é o "Príncipe da Paz" pregou o amor e ensinou: "Amai-vos uns aos outros", qual a razão de tanto ódio, rancor, provocações exatamente em nome do Evangelho?

Em condições normais a Bancada da Bíblia se junta à "Bancada do Boi" e à "Bancada da Bola" para atingir seus objetivos
A escolha dos três parlamentares não foi ocasional. Decorre de o fato de serem pessoas que demonstram seriedade, mantendo posturas de sobriedade no parlamento carioca. Por ocuparem campos divergentes e opostos politicamente, ouvi-los, talvez possibilite uma compreensão maior da obscuridade que vivemos com igrejas sendo invadidas, lideranças religiosas e cristão sendo intimidados, hostilizados e quase agredidos.
Os três condenam e criticam tudo que estamos vivendo, falam de uma polarização desnecessária. Cabe lembrar que o Brasil é um país laico e que a Constituição de 1891 acabou com a teocracia separando a igreja do Estado. Logo, religião e política nunca deveriam andar juntas ou caminhar lado a lado, mas não é o que ocorre.
Átila Nunes, Inaldo Silva e Reimont Otoni criticam o acirramento religioso e se mostram preocupados com o fanatismo
Átila Nunes.
“Jesus não nos ensinou a odiar”
“Confesso que me sinto decepcionado e mesmo agoniado com tudo isso. Em momento algum existe um texto bíblico um ensinamento sequer de Jesus que nos leve a odiarmos o outro, a nos agredirmos, a nos ofendermos por questões religiosas. Esse mar de lama pelo qual nos enveredamos é em razão de algumas lideranças religiosas com interesses pessoais terem propiciado esse clima que não deveria existir.
É algo na base do que se você pensa diferente de mim, se não acredita no que acredito, tem que ser agredido, condenado, eliminado. Esse desejo de impor uma fé a qualquer preço e de qualquer forma, tem nos levado a isso. Já de algum tempo a religião se transformou em sinônimo de acirramento e perseguição e isso chegou na política.
O lamentável é que esse contexto faz parecer que no Brasil não existissem sérios problemas como fome, desemprego, população de rua, racismo e desigualdade social. O que vemos hoje é um aparelhamento religiosos das instituições politicas. Ninguém pode escolher um ministro do STF por ser “terrivelmente evangélico”. Um ministro da educação não pode direcionar verbas a bispos ou pastores por preferencias religiosas ou partilharem de sua fé.
As lideranças da Igreja Católica com essas ofensas, agressões, invasões de seus templos, como aconteceu em Aparecida, começam a sofrer e a sentir na pele o que nós das religiões de matrizes africanas sofremos há muito tempo em proporções muito maiores. O que tem acontecido penso que é irreversível e os católicos terão que agir, terão que reagir, terão que tomar um atitude para que tudo isso cesse ou entraremos num terreno muito perigoso".
Inaldo Silva
“O bolsonarismo exacerbado não representa os evangélicos”
“Estamos num momento de extremismo por parte de algumas pessoas. Não consigo perceber qualquer ensinamento de Cristo em tudo isso, e tenho convicção de que no dia 01, quando tivermos o resultado das eleições tudo isso vai acabar. É preciso entender que Cristo em momento algum quis ou desejou o poder, sempre fez questão de enfatizar que “Meu reino não é desse mundo”.
O grande problema é que tudo isso se transformou num FlaXFlu, numa partida de futebol. A questão fundamental é que dois lados distintos, um querendo se impor um sobre o outro. De um lado, há um grande fanatismo religioso por parte de algumas pessoas, mas por outro, há um grande fascismo que confunde liberdade com libertinagem Os fanáticos religiosos que estão à direita querem se impor na política a qualquer preço através da religião. Já os fascistas de esquerda querem impor uma pseudo liberdade afrontando e ferindo princípios religiosos que é o alicerce do cristianismo.
Esse acirramento tem tido maior visibilidade agora, mas vem de algum tempo em passeatas de esquerda e mesmo desfiles de escolas de samba onde ofendem, desdenham e mesmo ironizarem a figura de Jesus Cristo. Isso não se justifica, assim como não se justifica entrar em um terreiro de umbanda e quebrar os santos e mesmo agredir as pessoas que frequentam esses terreiros.
É preciso ficar claro que essa taxa de bolsonaristas exacerbados e raivosos é muito baixa sem representar os evangélicos. Particularmente critico o extremismo dos dois lados, nada justifica tanto ódio, tanto acirramento e tenho esperança que tudo isso termine no dia seguinte às eleições independente de quem vença.
Reimont Ottoni
“A ideia de uma sociedade mais justa assusta muita gente”
“Penso que tudo isso se acentuou com o Golpe que vivemos em 2016, quando setores poderosos decidiram interromper a democracia e tirar do poder uma presidente legitimamente eleita. Ali, abriu-se a porta para pessoas avessas à democracia, que não respeitam o desejo do povo de tomar o poder e, com isso, pessoas nefastas que necessitavam que seus desejos fossem impostos se aproximaram do poder. Essas pessoas, principalmente, esses falsos religiosos, perceberam ali, a oportunidade de se aliarem ao poder e buscar mecanismos de uma imposição pela força e, com o tempo, passaram cada vez mais a adotar essa prática.
Essa ideia de uma sociedade mais justa, igualitária, sem preconceitos e racismos, sem tanta gente passando fome embaixo de marquises e espalhadas pelas calçadas incomoda e assusta muitas pessoas. A proposta de uma sociedade com oportunidades iguais ainda é uma ameaça para quem deseja se perpetuar no poder. Para essas pessoas, igualdade é um discurso da esquerda, de comunistas e deve ser combatido e aniquilado. Essas pessoas que se dizem cristãs e agem dessa maneira, se esquecem que amor, fraternidade, igualdade foram ensinamentos de Jesus Cristo. O que percebemos em todo esse contexto é uma visão equivocada e absolutamente deturpada. Igrejas, padres, pastores e bispos que defendem esses conceitos da igualdade, que é um ensinamento de Cristo são olhados como um estorvo e devem ser silenciados a qualquer preço.
O presidente Lula em seus dois primeiros mandatos tirou milhões de pessoas da linha de pobreza, possibilitou a inclusão de jovens pobres nas universidades, criou condições para que uma grande parcela da sociedade vivesse com mais dignidade, e isso incomoda. Contra a possibilidade de uma sociedade mais justa precisam criar mentiras, fake news, distorcer a verdade. A possibilidade dessas pessoas perderem o poder – algo Jesus nunca desejou -, tem levado esses fanáticos religiosos a partirem para as agressões físicas e verbais. Esse acirramento religioso é algo preocupante, mas acredito que seja algo que vai passar após esse período eleitoral, mesmo porque a justiça estará mais atenta e punirá essas pessoas que promovem a discórdia e promovem o ódio em nossa sociedade de maneira exemplar.
O joio e o trigo e a escalada da intolerância
Foi o próprio Jesus Cristo que ensinou em Matheus 13:24-30 que devemos separar o joio do trigo. Segundo São Matheus, durante o juízo final, os anjos vão separar os filhos do maligno (o joio e as ervas daninhas), dos filhos do reino, (o trigo). Apesar disso, e antes que chegue o “Juízo Final”, nosso judiciário poderia colaborar aplicando punições exemplares aos que em nome da fé ou de uma religião buscam ofender, apequenar, difamar e mesmo agredir o sagrado do outro.
Livros foram escritos ofendendo as religiões de matrizes africanas, centros de umbanda e terreiros de candomblé invadidos e destruídos e Santos da igreja católica quebrados. Recentemente, no dia 12 de outubro, a Basílica de Aparecida- padroeira do Brasil -, foi invadida por fanáticos com ofensas aos padres e fiéis. O pior o exemplo se propagou e se repetiu em Curitiba.
Culpa dos evangélicos?
– Não. Sob nenhuma hipótese. Culpa de fanatismo religioso disseminado, principalmente, por lideranças que ficaram milionárias em nome da fé de pessoas humildes, usando o nome de Cristo. Lobos em pele de cordeiro com residência fixa, identidade e CPF que constroem grandes templos e mansões por não pagarem impostos ao Estado. Pessoas carismáticas, simpáticas, que fazem cursos de oratória, se dizem religiosas, mas agem politicamente em benefício próprio e vão para suas redes sociais ofender, agredir, difamar quem discorda do que acreditam e pensam.
Talvez e, muito possivelmente, esses senhores sejam os “Falsos Profetas aos quais Jesus Cristo se referiu em Matheus 7:15 15-29: “Acautelai-vos, porém, dos falsos profetas, que vem até vos vestidos como ovelhas, mas interiormente são lobos devoradores. Por seus frutos os conhecereis. Não pode a árvore boa dar maus frutos ou a árvores má dar bons frutos”
Em 12 de outubro de 1994, o o bispo Sérgio Von Helder hoje aliado do presidente Jair Bolsonaro e critico ferrenho do STF chutou a imagem de Nossa Senhora Aparecida. Em 1997 O bispo Edir de Macedo, líder da Igreja Universal, lançou o livro "Orixás, Caboclos e Guias - Deuses ou Demônios" que associava as religiões de matrizes africanas ao demônio. Ao longo desses anos a perseguição prosseguiu às regiões de matrizes africanas com terreiros depredados. Agora a intolerância chega às Igrejas Católicas.

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